Frente à iminência das mudanças climáticas, a redução da emissão de GEE (Gases de Efeito Estufa) se tornou meta mundial obrigatória, e a tarefa está intimamente relacionada com a produção de energia, combustível e alimentos, que tem como base a atividade agrícola. Nesse contexto, a transição energética inescapável se materializa na substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis e na ampliação da energia limpa nos sistemas de fornecimento de eletricidade.

O Brasil, uma das maiores potências agrícolas do mundo, comprometeu-se em mitigar as emissões de poluentes e alcançar o desmatamento zero nas próximas décadas, e o setor que avança nessa empreitada é o sucroenergético, professor da disciplina de boas práticas de produção. O motor dessa mudança é a união da sustentabilidade na produção da cana-de-açúcar nas lavouras com a otimização do processamento da matéria-prima nas usinas.

Em uma visão global, a importância do país para o enfrentamento da crise climática não está só na oferta de grande quantidade de combustível renovável para o mercado internacional, mas também na competência em fazer com que toda a cadeia da cana e do etanol seja carbono neutro, concretizando, assim, a transição energética necessária.

Cana brasileira em números: análise do setor na safra 2022/23

A eficiência brasileira na produção de cana-de-açúcar melhora a cada safra. O ciclo 2022/23 na região Centro-Sul, responsável por grande parte da produção nacional, totalizou uma moagem nas usinas de 542 milhões de toneladas de cana até os primeiros dois meses deste ano. A produção de etanol cresceu 30,86%, em comparação com o mesmo período do ano anterior, alcançando 207,26 milhões de litros, enquanto a comercialização somou 1,09 bilhão de litros (+1,20%).

No total da safra até meados de fevereiro, a Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia) calculou a fabricação de 28 bilhões de litros de biocombustível, sendo o maior volume para o etanol hidratado, que já sai das usinas pronto para distribuição. A produção de etanol por si só já gera créditos de descarbonização no modelo CBio, uma vez que emite 90% menos poluentes se comparado à gasolina.

Para produzir um CBio, é preciso comprovar que deixaram de ser emitidas uma tonelada de CO2eq. Na produção de etanol, esse cálculo corresponde ao volume de produção, pois evita as emissões pela simples substituição de combustíveis fósseis pelo biocombustível. Pela lógica da transição energética, o estímulo ao consumo de combustível renovável aponta a necessidade de ampliar a produção, de maneira que uma maior oferta de etanol no mercado é o que sustenta esse processo de adesão à economia verde. 

Diante disso, foram registrados 38,21 milhões de CBio emitidos durante a safra de cana 2022/23, considerando os dados obtidos até 23 de fevereiro (4,85 milhões foram emitidos em 2023). Com essa quantidade, o Brasil atingiu a meta de 2022, e agora inicia a empreitada para alcançar o que o programa RenovaBio prevê para o próximo decênio, com o dever de emitir 37,47 milhões de CBio até o final do ano, como medida de cumprir com o compromisso de redução de emissões do setor.

A Unica ainda apresenta dados acumulados das safras de cana quanto ao resultado das lavouras, na produção da matéria-prima, e ao das usinas, na produção dos principais subprodutos industriais, como pode ser observado na tabela a seguir:

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Transição energética: o que a cana do Brasil tem a ver com isso?

Além do potencial do etanol brasileiro em substituir o combustível fóssil e impulsionar a descarbonização do segmento, a cana-de-açúcar tem potencial para acelerar a transição energética e a economia verde também em outros aspectos. A cultura ocupa somente 1% do território brasileiro, mas responde a 19% da matriz energética, de maneira que o país se torna central no debate de soluções definitivas para o problema climático e recebe vantagem na competitividade mercadológica. 

Isso não é por acaso. Enquanto os países da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) têm uma média de 11% de sua matriz energética baseada em fontes renováveis, o Brasil totaliza 48%, sendo a média global de 14%. Números que chamam a atenção das lideranças que buscam não apenas cumprir as metas, mas também transformar os métodos de produção e consumo.

Em se tratando de eletricidade, 84% do consumo brasileiro é renovável, muito superior ao que se vê na média mundial (27%). Esse potencial pode ser ainda mais aproveitado com a otimização do processo de produção nas usinas e o reaproveitamento dos resíduos da cana para a produção de biocombustíveis e bioeletricidade. Dessa forma, aumenta-se a oferta, sem a necessidade de ampliar a área dedicada ao cultivo.

A cadeia sucroalcooleira já se mostra uma alternativa para a transição energética, considerada por muitos a fonte de carbono renovável do futuro. O Brasil ainda é referência na descarbonização da cadeia produtiva, com metodologias de cultivo sustentáveis e processos industriais de baixa emissão.

Produtores e usinas já têm possibilidades para explorar esse potencial?

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A produção certificada de etanol, dentro dos padrões de sustentabilidade, já é uma realidade no Brasil, que segue e fomenta as boas práticas do setor canavieiro, algo que, inclusive, promove a valorização dos produtos sucroenergéticos, pela alta demanda mundial de combustível renovável.

Há análises sobre a viabilidade da combinação de etanol e hidrogênio como uma saída para o futuro do transporte em detrimento dos carros elétricos, facilitando o processo de adaptação da infraestrutura em países em que a rede de distribuição de álcool já está consolidada, mas os pontos de recarga continuam sendo um impeditivo para o aumento de frota de veículos sustentáveis.

Por outro lado, o setor canavieiro não produz somente etanol certificado. A cana-de-açúcar que sai das lavouras gera também outros subprodutos, como bioenergia, hidrogênio verde e biogás, consolidando o movimento de completa descarbonização do setor e de transição energética.

Usinas certificadas para tal feito não são mais raridades, incluindo também em sua receita a venda de créditos de carbono, que podem ser gerados desde a lavoura. Como resultado, tem-se o aumento das exportações para a União Europeia, por exemplo, que valoriza fortemente os produtos certificados da cadeia da cana-de-açúcar.

O que pode ser produzido no sentido de transição energética e descarbonização do setor?

Em primeiro lugar, destaca-se o etanol, que promete transformar a mobilidade urbana, sendo o combustível com a menor pegada de carbono do mundo. Melhorias na qualidade do ar e na qualidade de vida nas metrópoles já podem ser percebidas pelo uso do biocombustível, que responde a 48% do consumo dos meios de transporte brasileiros.

Além do hidratado e do anidro, o etanol 2G (segunda geração) implementa a eficiência produtiva do setor. O processo consiste no aproveitamento de dois terços da sacarose da cana, que não é utilizada durante a produção convencional. Para isso, foram desenvolvidas tecnologias para extrair essa substância contida no bagaço e na palha para direcionar à fabricação do etanol 2G, ou etanol celulósico. Assim, é possível aumentar em 50% o volume de combustível a partir de uma mesma quantidade de matéria-prima.

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Depois de explorada toda a eficiência de produção de etanol, a purificação do produto resulta ainda em substâncias que podem ser usadas para gerar energia elétrica, como a lignina. Assim, a bioeletricidade é o segundo subproduto da cana que torna a cultura um expoente da transição energética e que já está ao alcance dos profissionais do setor.

A quarta fonte de eletricidade mais importante do sistema brasileiro, a bioeletricidade a partir da cana-de-açúcar apresenta um potencial técnico para gerar 151 mil GWh, o que atenderia 30% do consumo total do país. Apenas 15% dessa eficiência é aproveitada atualmente, o que significa uma oportunidade de ampliar o papel do setor no processo de transição energéticaEstima-se que, até 2030, a bioeletricidade na rede nacional possa crescer 55%.

O biocombustível e a bioeletricidade podem voltar para a lavoura e fomentar as operações no campo para o cultivo da própria cana-de-açúcar, criando um ciclo renovável valioso. Além disso, práticas como o reaproveitamento de vinhaça localizada para o manejo, junto à aplicação de técnicas como plantio direto, rotação de culturas, integração lavoura-pecuária-floresta e uso consciente dos defensivos agrícolas completam o quadro de uma cadeia de cana amplamente descarbonizada, retendo o gás pela conservação do solo, entre outros benefícios.

Tudo isso leva ao que pode ser considerado um terceiro subproduto: o CBio. A compensação de carbono em todo o ciclo produtivo, do canavicultor até o consumidor, passando pela indústria, gera o crédito, que não só comprova a eficiência na transição energética e o compromisso no combate às mudanças climáticas, como também torna-se mais uma possibilidade de comercialização. 

Etanol Mais Verde: o início de tudo

O Protocolo Agroambiental Etanol Verde foi o que deu início à otimização do setor, abrindo caminhos para a eficiência de produção e para a transição energética. Lançado em 2007, associações e cooperativas de produtores e usinas foram aos poucos aderindo à iniciativa, que tinha como metas para avançar social e ambientalmente no setor o fim das queimadas na entressafra e o replantio de áreas nas propriedades rurais.

As usinas se comprometeram em adquirir cana-de-açúcar majoritariamente dos produtores que atendiam aos critérios. Já o canavicultor teve que aplicar mudanças no método de produção, mecanizando as lavouras e manejando o solo e a palhada sem o uso de fogo. Com isso, antecipou-se em sete anos o atingimento do objetivo de cessar a prática da queimada nos canaviais, evitando a emissão de 11,8 milhões de toneladas de CO₂eq (além daquele retido no solo pelas melhorias no manejo) e foram reflorestados mais de 250 mil hectares de mata ciliar nativa em 15 anos, adequando as áreas produtivas à legislação. 

Em 2023, 116 empresas e 12 associações assinam o Protocolo Etanol Mais Verde, de 2017, que foi criado como um reforço e uma atualização dos aprimoramentos no setor. São 5,1 mil produtores, de cujas mãos saem 47% do etanol produzido em todo o Brasil, um biocombustível que é fruto do compromisso das boas práticas agrícolas e vai para o mercado carregando a perspectiva de um futuro verde, bem suprido e rentável.

Outro ganho para o setor que o Etanol Mais Verde permitiu foi a preocupação com a eficiência do uso da água nas lavouras. O consumo do recurso foi drasticamente reduzido entre as safras 2010/11 e 2020/21, de 1,52 m³ para 0,77m³ por tonelada de cana. As usinas também reduziram seu consumo de água (-49%) nas etapas de processamento, a partir de sistemas de reuso, além de atuarem em programas de restauração florestal. 

Iniciativas que apoiam a canavicultura como protagonista da transição energética

Há ainda outras iniciativas, promovidas por empresas do agronegócio, que visam a descarbonização do setor, o impulsionamento da transição energética e a aplicação de medidas que colocam a cana brasileira como protagonista da economia verde. Algumas delas têm a participação da Syngenta, que promove as boas práticas agrícolas nas regiões produtoras pelo Brasil:

  • Programa Polinizar: fortalecimento da apicultura em locais próximos às áreas de produção canavieira, integrando técnicas de manejo entre apicultores e usinas.  
  • Novas tecnologias de plantio: desenvolvimento de uma muda de cana-de-açúcar que promove a simplificação do processo de semeadura, assemelhando-o às operações do cultivo de grãos. 
  • Desenvolvimento de cultivares: variedades de mudas clonadas com características superiores, resultando em alta produtividade e maior teor de açúcar.
  • Transferência de tecnologia: apoio e capacitação dos canavicultores, a fim de promover métodos de cultivo inovadores e apropriados para cada região, a exemplo do Meiosi, estratégia que intercala mudas de cana e de outras culturas. 

Por meio desses e de outros projetos, o cultivo e o processamento de cana no Brasil, aos poucos, torna-se referência mundial em sustentabilidade, considerando também os fatores sociais que o conceito abrange. 

Próximos passos: ações de hoje que constroem o futuro do setor a nível mundial

Tem-se muito a comemorar, mas o processo de melhoria é contínuo, e ainda há espaço para que o protagonismo brasileiro ganhe a visibilidade e a valorização que merece. Os novos objetivos de curto prazo visam que todas as usinas iniciem o replantio de matas ciliares presentes em suas propriedades e explorem o aproveitamento dos resíduos da cana para a produção de biocombustível e bioenergia, tornando possível atender ao compromisso de redução das emissões de GEE na atividade agrícola. 

A Syngenta está ao lado do produtor rural em todos os momentos, com o objetivo de impulsionar o agronegócio brasileiro com qualidade e inovações tecnológicas.

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