A produção de trigo no Brasil ocupa um lugar crucial na cadeia agrícola nacional, refletindo não apenas a importância da cultura para o abastecimento interno, mas também sua relevância crescente no cenário das exportações.

O trigo é um dos cereais mais consumidos no mundo, sendo essencial na produção de alimentos como pães, massas, bolos e biscoitos, itens que fazem parte da dieta diária da maioria dos brasileiros. 

Nos últimos anos, o país tem feito avanços significativos na produtividade e na adaptação de cultivares, permitindo a expansão do cultivo em novas regiões e contribuindo para a redução da dependência externa. 

Este texto explora o contexto do cultivo de trigo no país, destacando suas implicações econômicas, os desafios enfrentados pelos agricultores e as práticas modernas de manejo, essenciais para garantir a sustentabilidade e a competitividade da produção.

A produção de trigo no Brasil: cenário atual

Atualmente, o Brasil é um importante consumidor de trigo do mundo, com uma demanda interna que ultrapassa sua capacidade de produção. Embora seja um grande produtor, o país ainda importa uma quantidade significativa do cereal, principalmente da Argentina, para atender ao consumo interno. 

Quanto aos sistemas de produção, pode-se dizer que existem cultivo irrigado e em sequeiro.

  • Sequeiro: é o mais comum no Brasil, especialmente nas regiões Sul e Sudeste, onde as condições climáticas são mais favoráveis para o cultivo de trigo sem irrigação artificial. Nesse sistema, a produção depende exclusivamente das chuvas naturais para suprir as necessidades hídricas da planta ao longo do ciclo de cultivo.

O sucesso do trigo em sequeiro está intimamente ligado ao regime de chuvas, que deve ser bem distribuído durante as fases críticas do desenvolvimento da cultura, como a emergência, o perfilhamento e o enchimento dos grãos. No entanto, a produção em sequeiro enfrenta riscos significativos em anos de seca ou com distribuição irregular das chuvas, o que pode resultar em queda de produtividade e qualidade dos grãos.

  • Irrigado: embora menos comum, tem ganhado espaço em regiões onde as condições naturais de umidade não são suficientes para garantir a produtividade desejada, como no Cerrado. A irrigação permite um maior controle sobre a disponibilidade de água para as plantas, reduzindo a dependência das chuvas e proporcionando condições mais estáveis de crescimento e desenvolvimento. 

Isso resulta em maior produtividade e permite o cultivo de trigo em regiões anteriormente consideradas inadequadas para a cultura. No entanto, o custo de implantação e operação da irrigação pode ser elevado, exigindo um planejamento cuidadoso para garantir a viabilidade econômica

A produção nacional de trigo em 2024 está estimada em cerca de 8 a 10 milhões de toneladas, um número significativo, mas ainda insuficiente para suprir totalmente a demanda interna. Essa produção está concentrada em algumas regiões específicas do país.

Principais Estados produtores de trigo no Brasil

A produção de trigo no Brasil está concentrada majoritariamente na região Sul, com destaque para os Estados do Paraná e do Rio Grande do Sul que, juntos, representam a maior parte da produção nacional. 

Esses Estados possuem historicamente condições climáticas favoráveis ao cultivo do cereal, com invernos moderadamente frios e chuvas bem distribuídas ao longo do ano. Além disso, a disponibilidade de solos bem drenados e com boa estrutura e fertilidade fazem dessa região uma referência na triticultura nacional.

Outros Estados brasileiros também cultivam o cereal, embora em menor quantidade. É o caso de Santa Catarina, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais. Nos últimos anos, tem se observado uma significativa expansão das áreas de trigo no Cerrado, inclusive com recordes de produtividade em sistema irrigado.

Usos e destinos da produção de trigo

O trigo é uma das principais matérias-primas para a indústria alimentícia, sendo fundamental para a produção de farinha, pães, massas e biscoitos, que são produtos essenciais na dieta dos brasileiros. Além disso, o trigo também pode ser utilizado na fabricação de ração animal, amidos e outros produtos industriais.

A maior parte da produção de trigo no Brasil é destinada ao consumo interno, abastecendo moinhos e indústrias alimentícias em todo o país. Contudo, com o aumento da produção, o Brasil tem se consolidado também como exportador, especialmente para países africanos, onde o cereal brasileiro tem encontrado mercado.

Importância econômica do trigo no Brasil

A cultura do trigo possui uma importância econômica significativa para o Brasil, tanto pelo impacto direto na agricultura quanto pelo efeito multiplicador na economia. A cadeia produtiva do trigo gera milhares de empregos, desde o cultivo nas propriedades rurais até o processamento industrial e a distribuição dos produtos derivados.

A busca pela autossuficiência na produção de trigo é um objetivo estratégico para o país, que busca reduzir a dependência das importações e aumentar sua capacidade de exportação. 

O trigo brasileiro tem se destacado no mercado internacional pela qualidade, competitividade e capacidade de adaptação a novas exigências do mercado, como a produção de trigos especiais para panificação e massas de alta qualidade. 

Esses avanços na produção e na participação global do mercado do trigo também estão atrelados à capacidade de combater importantes desafios na fase de cultivo. 

Desafios no trigo: principais pragas, doenças e plantas daninhas

O cultivo de trigo no Brasil enfrenta desafios significativos em termos de manejo de pragas e doenças, que podem impactar severamente a produtividade e a qualidade do grão. 

Principais pragas do trigo

Entre os principais motivos de preocupação dos produtores, estão:

  • pulgões;
  • lagarta-do-trigo;
  • lagarta-militar;
  • percevejos;
  • corós;
  • gorgulhos.

A presença e o tamanho das populações dessas e de outras pragas no trigo é fortemente influenciada por fatores climáticos e práticas de manejo agrícola. Condições como temperaturas elevadas podem favorecer a proliferação desses insetos e acabar aumentando a intensidade das infestações. 

Além disso, práticas agronômicas, como a monocultura, o manejo inadequado dos resíduos culturais e o plantio fora do calendário ideal, facilitam a criação de ambientes propícios para o estabelecimento e a disseminação dessas pragas nas lavouras.

Principais doenças do trigo

Além das pragas, as doenças representam um risco constante. São diversas as doenças que afetam o trigo no Brasil, entre as quais podemos citar:

  • giberela (Gibberella zeae);
  • oídio (Blumeria graminis);
  • mancha-amarela (Pyrenophora tritici-repentis);
  • brusone (Pyricularia grisea);
  • ferrugem (Puccinia triticina);

A presença desses patógenos nas lavouras depende de uma série de fatores que interferem no aparecimento de doenças durante o cultivo do trigo, como:

  • condições climáticas: alta umidade, temperaturas amenas e chuvas frequentes são condições que favorecem o desenvolvimento de doenças fúngicas no trigo, como ferrugem e brusone.
  • variedades de trigo e diversidade genética: o uso de variedades geneticamente mais tolerantes a doenças é crucial, mas o cultivo em monocultura pode levar à adaptação de patógenos, exigindo uma importante atenção por parte do produtor.
  • práticas agronômicas: rotação de culturas, manejo de densidade de plantio e escolha adequada da data de semeadura são estratégias que podem ajudar a reduzir a incidência de doenças, evitando a propagação de patógenos.
  • presença de inóculo e resíduos de culturas anteriores: patógenos podem sobreviver em resíduos de colheita e no solo, servindo como fonte de inóculo para novas infecções. O manejo adequado desses resíduos e o controle do solo são essenciais para evitar surtos de doenças.

Principais plantas daninhas do trigo

Durante o ciclo de cultivo do trigo, algumas plantas daninhas costumam ser mais relevantes para a cultura, como:

  • azevém (Lolium multiflorum);
  • aveia (Avena strigosa e Avena sativa);
  • nabo forrageiro (Raphanus raphanistrum e Raphanus sativus);
  • capim-amargoso (Digitaria insularis).

A presença dessas plantas daninhas é influenciada por uma combinação de fatores ambientais e práticas de manejo. Condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento dessas espécies, como temperaturas amenas e umidade adequada, contribuem para sua proliferação nas lavouras. 

Além disso, solos férteis e bem drenados, ideais para o trigo, também favorecem o crescimento dessas plantas daninhas, tornando-as uma ameaça constante. A densidade e a uniformidade do plantio do trigo podem ainda criar espaços onde essas daninhas se estabelecem, competindo por recursos essenciais, como água, nutrientes e luz, e afetando negativamente o rendimento da cultura.

Práticas de manejo inadequadas, como a ausência de rotação de culturas e a utilização de sementes com baixa porcentagem de pureza, aumentam significativamente o risco de infestação por essas plantas daninhas. 

Além disso, o uso inadequado de herbicidas, seja pela escolha incorreta do produto ou pelo momento inadequado de aplicação, pode resultar em controle insuficiente, permitindo que essas plantas daninhas continuem competindo com o trigo.

Para um efetivo controle de pragas, doenças e plantas daninhas, é fortemente recomendado seguir os princípios do Manejo Integrado.

Manejo Integrado de Pragas e Doenças

Para enfrentar esses desafios, os agricultores adotam práticas do Manejo Integrado de Pragas (MIP) e Doenças (MIPD), que combinam diversas estratégias de controle de forma eficaz e sustentável. Esses manejos buscam equilibrar o uso de defensivos agrícolas (controle químico) com técnicas de manejo cultural e biológico, promovendo a saúde da lavoura e minimizando o impacto ambiental.

Controle cultural: envolve práticas que buscam evitar condições favoráveis ao desenvolvimento de pragas e doenças. Entre essas práticas, estão a rotação de culturas, que ajuda a quebrar o ciclo de pragas e patógenos específicos do trigo, e a escolha de épocas de plantio que evitam períodos de maior pressão dessas pragas e doenças. 

Além disso, com o auxílio da pesquisa agrícola na busca de cultivares mais tolerantes, principalmente a doenças, por meio do melhoramento genético, o plantio dessas variedades pode ser mais uma importante ferramenta para um manejo eficiente.

Controle biológico: é uma prática que tende a crescer no cultivo de trigo no Brasil. Ele envolve o uso de inimigos naturais, como parasitoides, predadores e microrganismos, para controlar as populações de pragas. O uso de produtos biológicos, como fungos entomopatogênicos e parasitoides, pode ser eficaz na redução das populações de pragas.

Controle químico: O uso de defensivos agrícolas deve ser feito de forma criteriosa, com base no monitoramento constante das lavouras e seguindo as recomendações técnicas do fabricante. A recomendação da aplicação de fungicidas é focada no controle preventivo, enquanto as pulverizações de inseticidas são mais indicadas nas situações de início das infestações das pragas.

Manejo de plantas daninhas no cultivo de trigo

A seguir, listaremos os principais métodos de controle aplicados para as plantas daninhas.

Controle cultural: a adoção de sementes certificadas e livres de contaminação, a limpeza dos maquinários agrícolas e a manutenção de áreas de bordadura limpas são práticas essenciais para evitar a introdução e a disseminação de plantas daninhas nas lavouras de trigo.

Controle mecânico: O controle mecânico, como a capina e o uso de roçadoras, é uma prática complementar que pode ser utilizada especialmente em áreas pequenas ou para o controle de plantas daninhas perenes.

Controle químico: O controle químico é frequentemente implementado com o uso de herbicidas seletivos que agem sobre as plantas daninhas sem prejudicar o trigo. A escolha do herbicida deve considerar a espécie de planta daninha presente, o estádio de desenvolvimento da cultura, as condições ambientais e a rotação de moléculas, para garantir a eficácia do tratamento e evitar a resistência a herbicidas.

Importante salientar que, no Manejo Integrado, seja de plantas daninhas, ou de pragas e doenças, é extremamente necessário priorizar o monitoramento constante da lavoura. A partir dessa prática, o produtor poderá ter maior certeza das condições da área e seguir com a melhor ferramenta disponível para o controle. 

Considerações finais: o futuro do trigo no Brasil

O trigo no Brasil continua a desempenhar um papel vital na agricultura e na economia do país. Com uma produção crescente e desafios contínuos, a cultura exige um manejo cuidadoso e integrado para garantir sua sustentabilidade e competitividade. 

O futuro do trigo brasileiro depende, entre tantos fatores, da capacidade dos agricultores de adotar novas tecnologias, diversificar as práticas de manejo e atender às demandas de um mercado cada vez mais exigente. A autossuficiência na produção de trigo é um objetivo ambicioso, e o país segue avançando para reduzir sua dependência das importações, para consolidar-se como um protagonista no cenário global de produção de cereais.