O trigo é uma das principais culturas no agronegócio brasileiro, não apenas por seu papel na alimentação humana, mas também por sua importância econômica. Sua produção se concentra principalmente nas regiões Sul e Sudeste. O país consegue produzir um cereal de boa qualidade, porém, ainda depende de importações para suprir a demanda interna. 

Apesar do avanço tecnológico e das práticas modernas adotadas no cultivo nos últimos anos, a cultura ainda enfrenta desafios significativos, sendo as pragas um dos principais. 

A presença de pragas, quando não controlada adequadamente, pode comprometer severamente a produtividade, aumentando os custos e diminuindo a qualidade dos grãos. Nesse texto, exploramos as principais pragas que afetam o trigo no Brasil e as medidas de manejo integrado para controlá-las.

Cenário das pragas do trigo no Brasil

O cenário das pragas no cultivo de trigo no Brasil tem se tornado cada vez mais desafiador devido a fatores climáticos, a intensificação das lavouras e a expansão da cultura para áreas menos tradicionais. O aumento da monocultura em algumas regiões também favorece a proliferação de pragas, como pulgões, percevejos e lagartas, que encontram condições ideais para se multiplicarem. 

Embora os avanços na tecnologia agrícola tenham melhorado o controle dessas pragas, elas ainda representam um sério risco à produtividade, exigindo monitoramento constante e estratégias integradas de manejo.

A presença de pragas no trigo pode variar conforme a localização e as condições sazonais, mas espécies como lagartas e larvas de solo se destacam pela sua recorrência e pelo alto potencial de danos às lavouras. 

Para enfrentar esses desafios, é de extrema importância conhecer corretamente as pragas que colocam em risco a lucratividade do produtor. A seguir, destacamos as principais espécies, suas características e seus danos no campo. 

Larvas de solo

Essas larvas, também conhecidas como corós, alimentam-se de sementes e raízes, podendo enterrar pequenas plantas no solo após destruir seu sistema radicular. 

Um coró em pleno desenvolvimento pode consumir até duas plantas de trigo por semana. Por serem polífagos, atacam diversas espécies, incluindo plantas cultivadas e plantas daninhas, causando impactos significativos no sistema agrícola.

As principais espécies encontradas no trigo são:

  • coró-das-pastagens (Diloboderus abderus);
  • vaquinha ou vaquinha-verde-amarela (Diabrotica speciosa);
  • larva-arame (Conoderus scalaris);
  • gorgulho-do-solo (Pantomorus spp);
  • coró-pequeno (Cyclocephala flavipennis).

Devido à sua ampla distribuição geográfica e ao potencial de danos, os corós são considerados as principais pragas subterrâneas do trigo. Por serem polífagos e de ciclo longo, diversas espécies de corós rizófagos podem ser encontradas nas regiões produtoras de trigo, dependendo das condições locais.

Essas características tornam a presença dos corós uma preocupação significativa em várias áreas de cultivo, com impactos variáveis, mas muitas vezes severos, sobre a produtividade das lavouras, principalmente em áreas infestadas sem práticas de controle.

Um ponto importante a se considerar é que os corós costumam se concentrar em manchas (reboleiras), e por isso, os prejuízos se espalham de forma irregular pela lavoura. 

Esse comportamento torna o manejo mais desafiador, pois as infestações nem sempre afetam uniformemente o campo, exigindo monitoramento e intervenções específicas.

Pulgões

Os pulgões ou afídeos, são insetos sugadores que atacam principalmente a espiga e as folhas do trigo, causando deformações e perda de vigor da planta. Nas condições climáticas brasileiras, se reproduzem principalmente por partenogênese, com fêmeas gerando ninfas diretamente

A qualidade do alimento e a densidade populacional influenciam a formação de indivíduos alados, que colonizam novas áreas. O tamanho das populações e taxa de reprodução dos pulgões variam conforme a temperatura e a disponibilidade de plantas. 

Os pulgões também são vetores do vírus do nanismo-amarelo (barley yellow dwarf virus – BYDV) transmitindo-o ao se alimentar da seiva de plantas infectadas, o que gera surtos anuais, principalmente no outono e na primavera.

Existem diversas espécies de afídeos e cada uma apresenta um padrão de comportamento conforme as condições climáticas e características do hospedeiro. Entre as espécies mais recorrentes nas lavouras, podemos citar:

  • pulgão-do-colmo-do-trigo (Rhopalosiphum padi);
  • pulgão-verde-dos-cereais (Schizaphis graminum);
  • pulgão-da-espiga-do-trigo (Sitobion avenae);
  • pulgão-preto-dos-cereais (Sipha maydis);
  • pulgão-da-folha-do-trigo (Metopolophium dirhodum);
  • pulgão-da-raiz-dos-cereais (Rhopalosiphum rufiabdominalis).

Percevejos 

Os percevejos são pragas sugadoras que causam danos diretos ao trigo ao perfurar os tecidos vegetais. O trigo pode ser afetado por percevejos em diversas fases de seu desenvolvimento, o que pode resultar em perdas significativas tanto na produtividade quanto na qualidade do cereal. 

Durante a fase vegetativa, os percevejos provocam manchas esbranquiçadas nas folhas, enrugamento, necrose e, em casos severos, morte do colmo principal. As folhas podem assumir um aspecto filiforme, e plantas malformadas podem surgir, com touceiras excessivas e porte reduzido. 

Na fase reprodutiva, o ataque resulta em espigas deformadas e esbranquiçadas, grãos abortados e redução no tamanho da planta. Esses sintomas afetam diretamente a produtividade da cultura.

Entre as diversas espécies que podem se alimentar do trigo, podemos destacar:

  • percevejo-barriga-verde (Diceraeus furcatus e Diceraeus melacanthus);
  • percevejo-verde (Nezara viridula);
  • percevejo-do-trigo (Thyanta perditor);
  • percevejo-raspador (Collaria scenica).

A duração do ciclo de vida dos percevejos, do ovo até o adulto, varia conforme a espécie e fatores como temperatura, fotoperíodo, umidade e qualidade da planta hospedeira. 

No cultivo de trigo, essas pragas levam geralmente entre 25 e 35 dias para alcançar a fase adulta. No entanto, há diferenças no tempo de desenvolvimento de cada estágio ninfal e na longevidade dos adultos, dependendo da espécie. 

Essas variações refletem a adaptação das espécies às condições ambientais específicas e às características da planta hospedeira.

Lagartas desfolhadoras

Nas regiões produtoras de trigo do Brasil, três espécies de lagartas são especialmente preocupantes: 

  • lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda);
  • lagartas-do-trigo (Mythimna sequax e Mythimna adultera). 

Essas pragas podem afetar o trigo em diversas fases de crescimento, desde a emergência até a colheita. Além de atacarem as folhas, essas lagartas também podem comprometer outros órgãos da planta.

Essas espécies possuem um ciclo de vida completo (ovo, larva, pupa e adulto), com duração influenciada diretamente pela temperatura. As fêmeas de ambas as espécies têm alta capacidade de postura, podendo depositar até 1.000 ovos, com eclosão de três a quatro dias. 

Essas lagartas são polífagas, o que significa que, além do trigo, elas podem atacar outros cereais de inverno, como cevada, centeio, triticale e aveia, além de outras culturas. 

Essa característica aumenta a preocupação dos produtores, já que as infestações podem ser prejudiciais para diversas plantações. Em anos com condições climáticas favoráveis, como temperaturas mais amenas e elevada umidade, as infestações podem ser ainda mais severas.

A lagarta-do-cartucho, também chamada de lagarta-militar, pode estar presente na lavoura durante a semeadura ou surgir a partir de ovos depositados pelas mariposas logo após a emergência do trigo. 

Essa praga causa danos significativos no período inicial de desenvolvimento da cultura, atacando plântulas e consumindo suas folhas. Em infestações severas, sua ação pode comprometer o estande de plantas, prejudicando o estabelecimento da lavoura e impactando negativamente a produtividade.

As pragas encontradas no trigo podem causar perdas significativas na lavoura, e além de conhecer as características de cada uma delas, torna-se indispensável o uso do Manejo Integrado de Pragas (MIP) para o controle adequado dessas ameaças.

MIP na cultura do trigo

O MIP é uma estratégia sustentável que combina diferentes métodos de controle, como práticas culturais, biológicas e químicas, visando manter as populações de pragas em um nível que não comprometa a produção e a lucratividade da cultura. 

O MIP é uma estratégia fundamental para o cultivo de trigo no Brasil, permitindo uma gestão mais eficiente e econômica das pragas, e se baseia em três níveis de população das pragas:

  • Nível de Dano Econômico (NDE):

O NDE é o ponto em que a densidade populacional de uma praga começa a causar perdas econômicas significativas. No manejo de pragas do trigo, esse conceito ajuda a definir quando as medidas de controle devem ser adotadas para evitar prejuízos maiores. 

A determinação do NDE é feita com base em fatores como o estágio de desenvolvimento da cultura, a intensidade da infestação e o valor do produto no mercado.

  • Nível de Controle (NC):

O NC é definido como a densidade populacional de uma praga em que medidas devem ser tomadas para evitar que a população ultrapasse o NDE. 

No caso das pragas do trigo, o monitoramento constante das lavouras é essencial para identificar o momento correto de intervenção.

  • Nível de Equilíbrio (NE):

O NE é a densidade populacional média que uma praga pode alcançar sem causar danos significativos à produção. 

O MIP visa manter as populações de pragas abaixo desse nível por meio de diversas práticas que favoreçam o equilíbrio do ecossistema e possibilitem bons resultados de produtividade.

Principais medidas de controle no MIP

As práticas de manejo das pragas do trigo no Brasil são baseadas em uma combinação de métodos que visam a sustentabilidade e a redução dos danos. A seguir, apresentamos algumas das medidas mais eficientes.

Monitoramento e amostragem

O monitoramento regular das lavouras é a primeira linha de defesa no MIP. Técnicas como o uso de armadilhas e amostragem de solo permitem identificar a presença de pragas antes que atinjam níveis críticos. 

Para a detecção de percevejos e lagartas, por exemplo, o uso de pano-de-batida é uma técnica muito comum e eficaz. A partir da detecção e identificação das pragas, o produtor tem a disposição diferentes tipos de controle, que devem ser prioritariamente aplicados de maneira integrada.

Controle cultural

Práticas culturais, como a rotação de culturas, o plantio direto e a escolha de cultivares resistentes, são fundamentais para o MIP. 

Essas práticas ajudam a reduzir a infestação de pragas ao promover um ambiente menos favorável para o seu desenvolvimento. A rotação de culturas, por exemplo, quebra o ciclo de vida de pragas específicas, como as larvas de solo.

Controle biológico

O controle biológico envolve o uso de inimigos naturais das pragas, como predadores, parasitoides e patógenos. No caso dos pulgões, a liberação de espécies de joaninhas, por exemplo, pode ajudar a reduzir as populações

Além disso, a introdução de fungos entomopatogênicos pode ser utilizada satisfatoriamente no controle da população de larvas de solo e lagartas.

Controle químico

O uso de inseticidas continua sendo uma ferramenta importante no MIP do trigo, especialmente em situações de alta infestação. 

No entanto, para seu uso, as recomendações técnicas de doses, intervalos de aplicações  e rotação de moléculas devem ser estritamente seguidas e deve ser integrado a outras práticas do MIP para evitar a seleção de organismos resistentes aos princípios ativos. 

Além das pulverizações a campo, o tratamento de sementes também é uma medida preventiva e eficaz contra pragas subterrâneas, como as larvas de solo e lagartas que atacam no início do ciclo.

O futuro do cultivo de trigo no Brasil

O sucesso das lavouras de trigo depende de uma visão sistêmica que considere, entre diversas questões, o controle efetivo de pragas, sempre integrando o conhecimento de cada espécie presente a campo com as práticas do MIP.

O MIP no cultivo de trigo é uma estratégia essencial para garantir a sustentabilidade e a rentabilidade da produção. A combinação de práticas culturais, biológicas e químicas, aliada ao monitoramento constante das lavouras, permite um controle mais eficaz das pragas, mantendo a população abaixo dos níveis de dano econômico. 

A adoção de novas tecnologias, como o uso de drones e sistemas de monitoramento digital, também promete aumentar a eficiência do MIP nos próximos anos, permitindo intervenções mais rápidas e precisas. Ao adotar essas práticas, os produtores podem garantir a saúde das lavouras de trigo e, ao mesmo tempo, manter a lucratividade e o equilíbrio dos ecossistemas agrícolas.