A produção de feijão no Brasil enfrenta desafios que vão além das variáveis climáticas e de mercado. Entre as ameaças fitossanitárias, a mancha-angular se destaca por seu alto potencial de destruição, comprometendo a produtividade de lavouras em diversas regiões do país. 

Reconhecida pela incidência crescente e pelos prejuízos que acarreta, essa doença exige atenção redobrada de produtores, agrônomos e especialistas em manejo. Os sintomas, que muitas vezes podem passar despercebidos nas fases iniciais, evoluem rapidamente, afetando diretamente a saúde e a produtividade das plantas.

Compreender o ciclo de vida do patógeno, os sintomas da doença e as condições que favorecem sua proliferação são fundamentais para a construção de uma estratégia de controle eficaz. Neste artigo, abordaremos o impacto da mancha-angular no feijão brasileiro, detalhando os sintomas e as formas de identificação, o cenário atual da incidência no país e as principais técnicas de manejo adotadas pelos produtores.

Incidência e impacto econômico da mancha-angular no Brasil

No Brasil, a mancha-angular representa um desafio fitossanitário recorrente para os produtores de feijão, especialmente nas regiões com clima quente e úmido, como o Sudeste e o Centro-Oeste. 

A variação climática nessas regiões, com períodos de alta umidade e temperaturas favoráveis, cria um ambiente ideal para o desenvolvimento do fungo Pseudocercospora griseola. Em anos de condições climáticas especialmente favoráveis ao patógeno, a doença pode levar a perdas de produtividade significativas, com reduções variáveis dependendo da suscetibilidade da cultivar e das medidas de controle adotadas.

Esses índices de perda afetam diretamente a economia agrícola e os preços do feijão no mercado interno, dada a relevância do Brasil como produtor e consumidor dessa leguminosa. 

As perdas econômicas devido à redução na qualidade e quantidade da colheita, representam desafios significativos para a sustentabilidade do cultivo. Assim, o conhecimento do fungo aliado ao controle eficaz e ao manejo integrado são fatores essenciais para a mitigação dos impactos da mancha-angular.

Sintomas da mancha-angular no feijão

A mancha-angular é mais comumente observada nas folhas, mas ela também pode surgir nas vagens, nos caules e nos ramos da planta. As primeiras lesões costumam aparecer nas folhas primárias, com formato quase circular e coloração castanho-escura, exibindo halos concêntricos. 

Já nas folhas trifolioladas, o sintoma mais típico, refletindo o próprio nome da doença, são as lesões de formato angular, delimitadas pelas nervuras. Essas lesões começam em tons acinzentados e tornam-se castanhas com o tempo. Quando a infecção é intensa, as lesões podem se unir, causando amarelecimento das folhas e desfolhamento prematuro

Nas vagens, as manchas iniciais são superficiais, quase circulares, de coloração castanho-avermelhada e com bordas escuras, variando de tamanho e, quando numerosas, podem coalescer, cobrindo a superfície da vagem. Vagens afetadas frequentemente produzem sementes deformadas e enrugadas

Nos caules, nos ramos e nos pecíolos, a planta pode desenvolver lesões alongadas de cor castanho-escura. Em condições de alta umidade, observa-se na face inferior das folhas, bem como nas vagens, caules e pecíolos, uma camada de cor cinza-escura a negra, chamada de corêmio, que corresponde aos corpos de frutificação do fungo.

Caraterísticas do patógeno

Para que a infecção ocorra e a doença progrida rapidamente, a temperatura ideal é em torno de 24 °C, com limites mínimos de 16 °C e máximos de 28 °C. A doença, embora possa aparecer nas folhas primárias, tende a se manifestar de forma mais severa somente após o florescimento do feijoeiro, fase considerada mais crítica, especialmente quando as condições climáticas são favoráveis ao patógeno. 

O fungo responsável pela mancha-angular pode sobreviver por até 19 meses em restos culturais na superfície do solo e, em alguns casos, também em sementes infectadas.

A disseminação da doença ocorre principalmente por meio de chuvas, ventos (correntes de ar), sementes contaminadas e partículas de solo infestadas. Entre as fontes primárias de inóculo estão as sementes infectadas, os resíduos culturais e as lavouras previamente contaminadas. Já as fontes de inóculo secundário são as lesões que se formam nas plantas dentro da própria lavoura. 

Fatores climáticos, como temperaturas moderadas e períodos de chuva ou alta umidade relativa, intercalados por baixa umidade, são determinantes no desenvolvimento de epidemias, intensificadas pela ação dos ventos. Outros fatores, como a suscetibilidade das cultivares, a agressividade do patógeno e o tipo de manejo agrícola utilizado, também influenciam o potencial epidêmico da doença.

Conhecer os sintomas e as características do fungo é essencial para planejar uma estratégia de controle eficaz na lavoura.

Manejo Integrado de Doenças (MID) para controle da mancha-angular

O MID é uma ferramenta estratégica que combina diversas práticas de controle para prevenir e minimizar o impacto da mancha-angular no feijoeiro. Essa técnica permite que o produtor mantenha a produtividade e a qualidade da cultura de forma eficiente, mitigando os riscos fitossanitários sem depender exclusivamente de uma única solução. 

Ao integrar monitoramento, práticas culturais, controle biológico e químico, o MID atua em diferentes frentes, dificultando o ciclo de vida do patógeno e a disseminação da doença.

Monitoramento da lavoura

O monitoramento contínuo da lavoura é o primeiro passo essencial no MID, permitindo identificar o surgimento precoce da mancha-angular. Inspeções regulares e análises de risco com base nas condições climáticas e no histórico da área ajudam a antecipar a identificação da presença do patógeno. 

Com o suporte de ferramentas tecnológicas, como sensores de clima e drones, o monitoramento se torna mais preciso e ágil, permitindo que o produtor reaja rapidamente com as medidas adequadas. Esse acompanhamento constante é crucial para o sucesso do MID, pois permite a intervenção antecipada antes que a doença cause maiores danos.

Controle cultural

O controle cultural envolve práticas que dificultam o desenvolvimento do patógeno e melhoram as condições de resistência da planta. Medidas como a rotação de culturas, adubação equilibrada e a escolha de cultivares tolerantes ajudam a reduzir o inóculo inicial do fungo na área e a limitar a sua disseminação. 

A rotação de culturas, por exemplo, evita o acúmulo de Pseudocercospora griseola no solo, interrompendo o ciclo de vida do fungo. Além disso, práticas de manejo de irrigação que reduzem o tempo de molhamento das folhas podem auxiliar na redução da infecção, diminuindo a presença do patógeno no ambiente e dificultando sua reprodução.

Controle biológico

O controle biológico é uma alternativa que utiliza agentes naturais, como fungos e bactérias antagonistas, para conter o avanço da mancha-angular. Esses agentes benéficos, aplicados na lavoura, atuam competindo por nutrientes e espaço, reduzindo a colonização do patógeno nas plantas. 

A utilização de produtos biológicos baseados em microrganismos antagonistas à Pseudocercospora griseola pode inibir o desenvolvimento do fungo, proporcionando um controle complementar ao MID. Diversas pesquisas têm sido conduzidas visando identificar as espécies com os melhores resultados no campo.

Com um enorme potencial de uso, o controle biológico contribui para o equilíbrio do ecossistema agrícola, promovendo uma lavoura mais saudável.

Controle químico

O controle químico é uma ferramenta eficaz no manejo da mancha-angular, mas exige uma aplicação técnica e responsável

Para atingir a eficácia dos fungicidas, recomenda-se adotar uma estratégia preventiva, aplicando os produtos antes de encontrar sinais da doença, principalmente se houver condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento do fungo, como alta umidade e temperaturas moderadas. A aplicação preventiva reduz a pressão da doença e evita que ela se estabeleça em níveis críticos, mantendo o feijoeiro saudável ao longo do ciclo.

Outro fator importante é a rotação de moléculas. O uso repetido de fungicidas com o mesmo mecanismo de ação pode levar à seleção de fungos resistentes, comprometendo a eficiência dos produtos. Alternar os princípios ativos utilizados ao longo do ciclo de aplicação é fundamental para prevenir a resistência do patógeno, prolongando a vida útil das moléculas e mantendo o controle da doença no médio e longo prazo. 

O suporte técnico especializado, com recomendações baseadas em estudos da lavoura e do clima local, também é essencial para a efetividade do controle químico, permitindo que os fungicidas sejam aplicados de maneira estratégica e eficiente.

O Manejo Integrado de Doenças, ao combinar diferentes técnicas, permite um controle mais robusto e sustentável da mancha-angular, contribuindo para a produtividade e qualidade da cultura de feijão.

Protegendo a lavoura de feijão contra a mancha-angular

O cultivo de feijão no Brasil é essencial para a economia e a alimentação, mas a presença de doenças como a mancha-angular impõe desafios que demandam um manejo integrado e eficiente. A Pseudocercospora griseola, responsável pela doença, se beneficia das condições climáticas do país para se desenvolver, e sua capacidade de sobrevivência e propagação reforça a necessidade de um controle rigoroso.

Para os produtores, a prevenção, o monitoramento frequente e os diferentes métodos de controle são pilares na proteção da lavoura. A integração de práticas culturais, controle químico e técnicas de monitoramento é a maneira mais eficaz de proteger o feijão da mancha-angular, alcançando a qualidade e a produtividade das colheitas, além de fortalecer a segurança alimentar e a sustentabilidade da produção brasileira.