O cultivo de melancia no Brasil é uma prática de significativa relevância na olericultura nacional. Com condições climáticas favoráveis e solos adequados, o país se destaca como um dos principais produtores mundiais dessa fruta tropical.
Estados do Nordeste lideram a produção brasileira, proporcionando melancias para o consumo interno e até para exportação, com destaque para mercados exigentes que apreciam a qualidade da fruta brasileira.
Com alta demanda durante o ano inteiro e consumo acentuado no verão, a produção de melancia oferece boas oportunidades de negócios. A fruta se destaca por seu sabor refrescante e elevado teor de água, tornando-se popular para o consumo in natura, em sucos, saladas e até em receitas gourmet.
Contudo, o cultivo de melancia exige conhecimento e manejo adequado para alcançar uma produção de alta qualidade e produtividade satisfatória. Para isso, fatores como as características agronômicas e o manejo de pragas e doenças devem ser considerados com atenção.
Este artigo explora os principais pontos que envolvem o cultivo de melancia, abordando os aspectos botânicos da planta e as melhores práticas de manejo agrícola.
Características agronômicas e botânicas da melancia
A melancia (Citrullus lanatus) pertence à família das Cucurbitáceas e é uma planta rasteira que se adapta bem ao clima tropical e subtropical. Originária da África, a planta possui raízes pivotantes e um sistema vegetativo vigoroso e boa adaptação em solos arenosos. Suas folhas são grandes, recortadas e têm uma função importante na fotossíntese e proteção dos frutos contra o sol intenso.
A flor da melancia é de coloração amarela e apresenta polinização cruzada, ou seja, depende de agentes polinizadores, como as abelhas, para garantir a fecundação das flores femininas e o desenvolvimento do fruto. Dessa forma, o manejo adequado de insetos polinizadores é essencial para uma produção eficaz, uma vez que a produtividade está diretamente ligada à presença de polinizadores no cultivo.
A melancia possui variedades que diferem em tamanho, cor da polpa e da casca, sendo que algumas das mais comuns incluem a Crimson Sweet, conhecida pela polpa vermelha e sabor doce, e a Sugar Baby, de menor porte e sabor marcante. A escolha da variedade deve considerar o perfil do mercado-alvo, bem como as condições climáticas e de solo da região de cultivo, além das características específicas de cada cultivar.
Ciclo de cultivo da melancia
O ciclo de cultivo da melancia varia de 75 a 120 dias, dependendo da variedade e das condições climáticas. A semeadura geralmente ocorre entre o final do verão e o início da primavera, aproveitando o clima quente e a disponibilidade de chuvas. Em regiões tropicais, é possível realizar mais de um ciclo anual, proporcionando uma colheita contínua e maior rentabilidade ao produtor.
O desenvolvimento da planta é dividido em fases: germinação, crescimento vegetativo, floração, frutificação e maturação. A fase de germinação dura cerca de uma semana, e o crescimento vegetativo é rápido, especialmente em condições de alta luminosidade e temperaturas amenas. Após a floração, a planta entra na fase de frutificação, quando ocorre o desenvolvimento dos frutos, que pode durar até 50 dias.
Durante todo o ciclo, o produtor deve estar atento à presença de pragas, doenças e plantas daninhas, ajustando o manejo conforme necessário para evitar que esses fatores comprometam o desenvolvimento saudável da lavoura e a qualidade da colheita.
Pragas da melancia
No cultivo de melancia, algumas pragas podem comprometer a produtividade e a qualidade dos frutos, demandando estratégias de manejo eficazes. A seguir, serão detalhadas as principais espécies que podem atrapalhar a produção.
Lagarta-rosca
A Agrotis ipsilon é uma praga presente durante todo o ano, com maior incidência na estação chuvosa. As larvas, de coloração escura e hábitos noturnos, abrigam-se no solo durante o dia e se enrolam rapidamente ao serem tocadas, comportamento que deu origem ao nome “lagarta-rosca”.
Os adultos são mariposas escuras, com asas anteriores que exibem manchas triangulares negras, enquanto as asas posteriores são claras. Cada fêmea pode depositar cerca de 1.000 ovos, geralmente nos ramos e nas folhas da planta. O ciclo de vida completo do inseto varia entre 34 e 64 dias.
As larvas atacam as plântulas, abrindo galerias na base do caule e cortando-as rente ao solo, causando danos significativos ao cultivo.
Broca das cucurbitáceas
Existem duas principais espécies dessa mariposa danosa ao cultivo da melancia: Diaphania hyalinata e Diaphania nitidalis. A principal diferença entre ambas é a coloração das asas dos adultos. A D. hyalinata possui asas translúcidas e bordos retilíneos e escuros, enquanto a D. nitidalis apresenta asas de coloração marrom-violácea com uma área central amarelada e translúcida.
Ambas as espécies costumam fazer sua oviposição nas flores, nas folhas, nos ramos e nos frutos da melancia. Assim que os ovos eclodem, as larvas são esverdeadas e atingem até 2 cm de comprimento.
Essa praga causa danos significativos aos talos e às hastes das plantas, resultando em murcha e secagem dos tecidos afetados. No entanto, o maior prejuízo ocorre quando ataca os frutos das cucurbitáceas, especialmente no início do desenvolvimento, podendo levar a perdas totais da produção.
Ao perfurar os frutos, essa praga os torna impróprios para o consumo e, frequentemente, provoca seu apodrecimento completo devido à entrada de organismos saprófitas, que aceleram o processo de decomposição.
Lagartas
Lagarta é o nome comum dado às diversas espécies de larvas de insetos da ordem dos lepidópteros, correspondendo à primeira fase da vida de borboletas e mariposas, antes de sua transformação em crisálida. Essas lagartas se alimentam de folhas, flores e frutos, cortando ou raspando suas superfícies.
No cultivo de melancia, diversas espécies de lagartas podem causar danos, sendo as mais comuns dos gêneros Spodoptera e Helicoverpa. Essas lagartas frequentemente se encontram na face inferior das folhas, onde se alimentam intensamente de folhas, caules, flores e até da casca dos frutos, reduzindo a produção e inviabilizando a comercialização dos frutos danificados.
Pulgões
Esses insetos sugadores possuem cerca de 1,5 mm e apresentam coloração que varia do amarelo-claro ao verde-escuro. As espécies mais comuns são Myzus persicae e Aphis gossypii.
Eles se concentram principalmente na parte inferior das folhas e nos brotos jovens, regiões nas quais sugam a seiva da planta. Nas regiões tropicais, todos os indivíduos são fêmeas e se reproduzem assexuadamente por partenogênese, originando novos insetos geneticamente idênticos.
Em casos de infestação elevada, surgem insetos alados, que facilitam a dispersão da espécie para outras áreas de cultivo. Geralmente, as colônias de pulgões atraem formigas, que se beneficiam do excesso de seiva liberado.
Os pulgões também são vetores de viroses de forma não circulativa, como o PRSV-W (vírus da mancha-anelar do mamoeiro-estirpe melancia), o CMV (vírus-do-mosaico do pepino), o SqMV (vírus-do-mosaico da abóbora), o WMV-2 (vírus-do-mosaico da melancia 2) e o ZYMV (vírus-do-mosaico-amarelo da abobrinha).
Esses insetos se aglomeram nas partes inferiores das folhas e nas brotações novas, sugando a seiva, injetando toxinas e transmitindo viroses. Além disso, a secreção açucarada que expelem atrai formigas e favorece o desenvolvimento de fungos saprófitas na superfície foliar.
As toxinas injetadas causam o encarquilhamento das folhas, e a infecção viral pode resultar em perdas significativas, com redução da área foliar, formação de mosaicos com bolhas, enfezamento, deformação dos frutos e alterações em sua coloração.
Outras pragas
Além das espécies já descritas, alguns outros insetos também podem ser prejudiciais ao cultivo da melancia, é o caso de:
- tripes (Frankliniella spp.; Thrips palm);
- mosca-branca (Bemisia tabaci);
- percevejo-gaúcho (Leptoglossus spp.);
- vaquinha (Diabrotica speciosa);
- paquinhas (Neocurtilla hexadactyla; Scapteriscus spp).
Doenças da melancia
As doenças no cultivo de melancia são um dos principais desafios para a produtividade, causadas principalmente por fungos, bactérias e vírus, que podem comprometer o desenvolvimento e a qualidade dos frutos.
Fusariose
É causada pelo fungo Fusarium oxysporum e está presente em praticamente todas as regiões onde a melancia é cultivada, podendo provocar danos significativos à cultura. Esse patógeno age colonizando o sistema vascular da planta, obstruindo os vasos condutores de seiva e comprometendo seu desenvolvimento.
Em plântulas, a infecção leva à interrupção do crescimento, murcha dos cotilédones e podridão do hipocótilo ou do colo, resultando no tombamento e morte das mudas. Em plantas adultas, os sintomas incluem clorose, enfezamento e, em estágios mais avançados, morte parcial ou total da planta, especialmente acima do ponto de infecção.
Durante as horas mais quentes do dia, é comum observar a murcha das plantas devido à colonização do xilema pelo fungo. O patógeno pode se espalhar para outros tecidos, atingindo ocasionalmente os frutos e contaminando as sementes.
O fungo produz estruturas de resistência chamadas clamidósporos, que permitem sua sobrevivência por vários anos, mesmo em condições ambientais desfavoráveis. Essas estruturas podem ser encontradas em restos de cultura, solo e sementes infectadas.
A disseminação da doença ocorre principalmente por meio de vento, água, partículas de solo e sementes contaminadas. Condições de temperatura do solo entre 23 °C e 28 °C, alta umidade relativa e solos ricos em matéria orgânica favorecem o desenvolvimento do fungo. A presença de nematoides, que causam ferimentos nas raízes e facilitam a penetração do patógeno, é um fator importante para o estabelecimento da doença.
Míldio
A doença causada pelo fungo Pseudoperonospora cubensis manifesta-se por manchas angulares e necróticas na região internerval das folhas, geralmente de coloração marrom e circundadas por halos amarelos.
Na face inferior das folhas, é possível observar a frutificação do patógeno, com esporangióforos e esporângios que apresentam uma coloração purpúrea, especialmente em períodos de alta umidade relativa. Sob condições climáticas favoráveis, múltiplas lesões podem se unir, levando à necrose dos tecidos e à queda precoce das folhas.
Mesmo na ausência de plantas de melancia, o fungo pode sobreviver em outras cucurbitáceas, mantendo um ciclo de crescimento contínuo. A disseminação dos esporângios ocorre por meio do vento, respingos de água da chuva, irrigação por aspersão, orvalho e insetos. A alta umidade relativa do ar é um fator que favorece significativamente o desenvolvimento dessa doença.
Antracnose
A doença causada pelo fungo Colletotrichum orbiculare está presente em todas as regiões produtoras de melancia do Brasil. O patógeno pode se desenvolver em toda a parte aérea da planta e atacar em qualquer estádio de desenvolvimento.
As lesões nas folhas surgem inicialmente nas nervuras, com formato angular que evolui para uma forma circular. No início, apresentam coloração castanho-claro a pardo-acinzentada, mas com o tempo tornam-se castanho-escuro ou pretas. Em infestações severas, as plantas podem aparentar estar queimadas.
Nas hastes e pecíolos, as lesões começam como áreas alongadas, estreitas e encharcadas, que posteriormente ficam castanhas. Essas manchas podem circundar completamente a haste e o pecíolo, resultando na queda das folhas e na morte dos brotos.
Em frutos novos, a doença pode causar má formação ou queda precoce. Nos frutos já desenvolvidos, as lesões aparecem inicialmente como pequenas manchas amareladas, arredondadas e levemente elevadas, que se tornam deprimidas, circulares e de coloração negra, com anéis concêntricos visíveis.
O fungo é capaz de sobreviver no solo e em restos culturais por um a dois anos. A disseminação no campo ocorre principalmente por insetos e pelo respingo de gotas de chuva ou de irrigação por aspersão.
Demais doenças
É importante ressaltar que o cultivo de melancia também é suscetível a diversos outros patógenos, como:
- mancha de alternaria (Alternaria cucumerina);
- podridão do fruto (Phytophthora capsici);
- murcha de esclerócio (Sclerotium rolfsii);
- cercosporiose (Cercospora citrulina);
- mancha bacteriana da melancia (Acidovorax avenae subsp. citrulli);
- vírus da mancha-anelar-do-mamoeiro estirpe melancia (Papaya ringspot virus watermelon strain, PRSV-W);
- vírus-do-mosaico-da-melancia 2 (Watermelon mosaic virus 2, WMV-2).
Plantas daninhas no cultivo de melancia
As plantas daninhas representam um desafio significativo no cultivo da melancia, competindo por luz, água e nutrientes essenciais e podendo impactar negativamente a produtividade da lavoura.
As espécies mais comuns que afetam as plantações de melancia variam de acordo com a região, mas algumas se destacam pela sua ampla disseminação e capacidade de adaptação.
- Capim-colchão (Digitaria spp.): essa gramínea é conhecida por sua rápida propagação e pelo crescimento denso que pode sufocar as plantas de melancia, reduzindo a área disponível para o desenvolvimento da cultura.
- Caruru (Amaranthus spp.): uma das plantas daninhas de maior preocupação, o caruru cresce rapidamente e é muito adaptável, competindo agressivamente por nutrientes e luz.
- Corda-de-viola (Ipomoea spp.): essa trepadeira forma densos emaranhados que podem envolver as plantas de melancia, dificultando seu crescimento e desenvolvimento.
- Picão-preto (Bidens pilosa):comum em muitas regiões, essa planta daninha cresce em solos de diferentes fertilidades e é particularmente problemática por sua alta produção de sementes.
- Capim-marmelada (Brachiaria spp.): conhecida por sua resistência e crescimento vigoroso, a Brachiaria pode se espalhar rapidamente e competir com a melancia por água e nutrientes.
- Beldroega (Portulaca oleracea): essa planta rasteira se desenvolve bem em climas quentes e solos ricos, competindo diretamente com a melancia.
- Capim-arroz (Echinochloa spp.): essa espécie é comum em áreas úmidas e pode se tornar uma praga em regiões de cultivo irrigado, prejudicando o desenvolvimento das plantas de melancia.
- Mentrasto (Ageratum conyzoides): planta de crescimento acelerado que se adapta bem em solos férteis, sendo um concorrente forte por espaço e nutrientes.
- Maria-pretinha (Solanum americanum): um arbusto que, além de competir por recursos, pode servir como hospedeiro para pragas e doenças que afetam a melancia.
A presença dessas plantas daninhas pode reduzir significativamente a produtividade do cultivo de melancia, interferindo no acesso das plantas à luz solar e diminuindo a eficiência da absorção de nutrientes e água. Para enfrentar esses desafios de plantas daninhas, além da ocorrência de pragas e doenças, o produtor deve optar pelo manejo integrado.
Controle de pragas, doenças e plantas daninhas com manejo integrado
O manejo integrado é uma estratégia para controlar pragas, doenças e plantas daninhas de forma eficaz, promovendo a saúde da lavoura e visando a sustentabilidade da produção. No cultivo da melancia, o manejo integrado combina diferentes métodos de controle e oferece diversas vantagens, como o aumento da eficiência do controle, a preservação da biodiversidade e a manutenção da produtividade ao longo das safras.
Um dos principais pilares do manejo integrado é o monitoramento constante da plantação. Esse processo envolve a inspeção regular das áreas de cultivo para identificar precocemente a presença de pragas, doenças ou plantas daninhas e avaliar a sua severidade. Essa prática permite que os produtores tomem decisões informadas sobre o tipo de controle mais adequado e o momento certo de aplicá-lo.
- Controle cultural
O controle cultural envolve práticas agrícolas que criam um ambiente menos favorável ao desenvolvimento de pragas, doenças e plantas daninhas. No cultivo de melancia, essas práticas podem incluir a rotação de culturas, o uso de variedades adaptadas e o manejo da irrigação para evitar condições que favoreçam a proliferação de agentes patogênicos e plantas daninhas. Essas técnicas fortalecem o sistema radicular e a resistência da planta, tornando-a menos suscetível a ataques.
- Controle biológico
O controle biológico utiliza organismos naturais, como predadores e parasitoides, para manter as populações de pragas sob controle. Essa estratégia promove o equilíbrio ecológico e reduz a pressão de pragas de forma sustentável.
A introdução de insetos benéficos que se alimentam das larvas das pragas comuns em plantações de melancia pode ajudar a controlar a infestação sem causar danos às plantas ou ao ambiente. O uso de fungos e bactérias que competem com patógenos causadores de doenças também pode ser uma parte eficiente do manejo.
- Controle mecânico
O controle mecânico envolve métodos físicos para remover ou suprimir a presença de plantas daninhas. No cultivo de melancia, isso pode incluir a remoção manual de plantas daninhas e o uso de capinas. A roçada e o manejo de cobertura morta são outras práticas que podem limitar o desenvolvimento de espécies indesejadas, ajudando a manter a lavoura mais limpa e produtiva.
- Controle químico
O controle químico, é uma importante parte do manejo integrado e deve ser aplicado de forma criteriosa. Sua utilização é orientada pelo monitoramento e pelas práticas de manejo, permitindo que seja uma medida complementar e não exclusiva.
A aplicação direcionada de produtos específicos contribui para a eficácia do controle sem comprometer o equilíbrio do ecossistema da plantação. Além disso, é essencial seguir as recomendações técnicas do fabricante, como doses corretas, intervalos de aplicação, condições meteorológicas e rotação de ingredientes ativos.
Oportunidades e desafios do cultivo de melancia no Brasil
O cultivo de melancia apresenta-se como uma excelente oportunidade para produtores em diversas regiões do Brasil. Com demanda constante e um mercado interno sólido, a melancia destaca-se por seu potencial de lucratividade.
Por meio de técnicas eficientes e manejo integrado, os produtores podem melhorar a qualidade da produção, mantendo a competitividade no mercado e contribuindo para a sustentabilidade do agronegócio brasileiro. A produção de melancia, com planejamento e manejo adequados, representa não apenas um negócio lucrativo, mas também uma fonte de alimento refrescante e saudável para o consumidor.
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